sábado, abril 30, 2005

Poesia e Tragédia

A literatura grega pré-clássica é a expressão do processo de auto-formação/perfectibilização do homem. Esse processo registado pela literatura, é a vivência da moralidade pela moral vivida, ou seja, as manifestações do homem, o que é diferente da moral convencionada, que a título de exemplo, refiro os Direitos Humanos.
Nesta fase da humanidade ainda não se falava de ética, de moral ou de direito. Considera-se este um pré-momento da norma, que apesar de ainda não racionalizada, já estava exemplificada na Poesia, deliberada nas Tragédias (porque já era reflectida), expressa e percebida pelos 7 Sábios na dimensão individual e social e no Orfismo é francamente percebida, na medida em que o homem presta já contas da sua vida.
A poesia retrata narrativas acerca da relação da vida dos deuses com os homens. São teogonias sobre a condição do homem e o seu destino. Os temas passam pela educação e a virtude, que é a excelência do homem (arete), e os exemplos são dados por heróis. A arete é vista como um atributo de formação física e dirigida aos atributos físicos do herói.
O homem grego não tem liberdade, torna-se quase impotente e condicionado perante a força do destino (moira) que acreditava já estar traçado.
As tragédias são normativas para a comunidade e funcionam como formação espiritual do homem. Há nas tragédias uma vivência, um drama existencial mais profundo, e aqui, o homem já ganha maior dimensão espiritual, está mais humanizado. Logo, a sua capacidade deliberativa aumenta conforme a trama que aumenta também nas tragédias. Os temas tratados são a vontade, o destino, a deliberação, a lei divina e a lei cósmica e os exemplos dados são também através dos heróis e heroínas.
Apesar das parecenças com a poesia, as manifestações da necessidade, quer da Natureza quer do destino são visíveis, mas já com menos peso, com manifestações mais ténues. A força do destino vai diminuindo porque a dimensão espiritual do homem aumenta, intensifica-se ao avançar do tempo. Aqui as qualidades exaltadas são claramente as psicológicas, a arete deixa de ser uma excelência física e passa a ser uma excelência espiritual. Começa-se a perceber uma procura por respostas, um descobrir da interioridade, e isso nota-se pelos heróis que começam já a revelar sentimentos e a exprimir a sua fraqueza, típica do homem.
Todas as tragédias exprimem uma normatividade, mas já para a comunidade e não como na poesia, que seria o exemplo para cada um. Todas são histórias acerca de deliberações.
Antígona é para Heidegger, a primeira obra ética, exprime o dilema entre a ética e o direito. A ética na pele de Antígona e o direito pela sua irmã Esmera. A acção de Antígona é determinada pela consciência e a acção de Esmera determinada de acordo com a lei política. Um dilema que representa a indecisão entre seguir aquilo que lhe dita a consciência ou obedecer às leis.

1 comentário:

LN disse...

Ah... as deliberações. E as escolhas...

RD, deixei um desafio-passagem-de-testemunho, lá no conversamos. Bem dirigido e sem problemas de deliberação :)